domingo, 1 de novembro de 2009

TRICOTILOMANIA - UMA SÍNDROME MILENAR

Embora já presente nos escritos hipocráticos (Epidemias I e III), foi só em 1889 que o dermatologista parisiense F. Hallopeau descreveu o comportamento de um jovem que arrancava os cabelos e identificou a condição como uma síndrome médica, sugerindo o nome de tricotilomania – nome derivado das palavras gregas thrix (cabelo) e tillein (arrancar) mais mania, denotando um comportamento anormal por não parar o impulso mórbido de arrancar cabelo por algum motivo não específico.

A Tricotilomania (TTM) é um transtorno psiquiátrico crônico caracterizado como um Transtorno do Controle do Impulso Não Classificado em Outro Lugar a partir do DSM-IV-TR, o diagnóstico de TTM requer: (a) comportamento recorrente de arrancar os cabelos, resultando em perda capilar perceptível; (b) sensação de tensão crescente, imediatamente antes de arrancar os cabelos ou quando o indivíduo tenta resistir ao comportamento; (c) prazer, satisfação ou alívio ao arrancar os cabelos; (d) o distúrbio não é mais bem explicado por outro transtorno mental, nem se deve a uma condição médica geral (por exemplo, uma condição dermatológica), e) o distúrbio causa sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social ou ocupacional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. Embora consistente com os critérios diagnósticos do DSM-IV, a classificação da TTM (F63.3) da CID-10 não menciona angústia associada ou prejuízo no funcionamento social.

Os estudos apontam que arrancar cabelo/pêlo pode acontecer em qualquer região do corpo como: couro cabeludo, cílios, sobrancelhas, região púbica, extremidades, axila e abdômen. A relação entre gênero é de três mulheres para cada homem. Uma série de fatores ligados principalmente a infância e adolescência podem exercer papel desencadeador ou exacerbador da TTM, como estados afetivos negativos e atividades sedentárias ou contemplativas.

Informes clínicos sugerem que pacientes diagnosticados com TTM não têm psicopatologia secundária significativa. Entretanto, transtornos do eixo I como os afetivos, de ansiedade e de vícios (álcool e drogas) são freqüentemente associados à TTM. Quanto aos transtornos de eixo II os mais descritos na literatura são: Histriônico, Borderline, Passivo-agressivo e Obsessivo-compulsivo.

Os principais objetivos do tratamento de pacientes com TTM são a remissão do sintoma de arrancar cabelo e melhora das co-morbidades clínicas/psiquiátricas; também melhora na qualidade de vida e possível resolução dos problemas pessoais e familiares. Um pesquisador sugeriu que a combinação de farmacoterapia e terapia comportamental podem ser efetivas para o tratamento da TTM de longo prazo, reforçando a idéia de uma abordagem multidisciplinar para seu tratamento.

Uma variedade de medicamentos apresenta resultados positivos no tratamento da TTM, incluindo antidepressivos tricíclicos, ISRS, antidepressivos de ação dupla, antipsicóticos, antagonista opióide e estabilizador de humor (lítio).

Várias técnicas comportamentais são empregadas no tratamento da TTM, incluindo biofeedback e hipnose. Enquanto muitas dessas técnicas foram achadas efetivas na redução dos sintomas do arrancar cabelo, a eficácia de cada uma delas não foi efetivamente estabelecida, uma vez que os dados foram gerados por estudos de casos não-controlados e/ou com pequenas amostras.

O tratamento do comportamento mais estudado e com apoio de dados empíricos foi o treinamento da reversão do hábito (TRH). No primeiro estudo (1973) em TRH, o tratamento foi 90% efetivo na redução de problemas de comportamento de 12 pacientes com uma variedade de transtornos do hábito, incluindo a TTM. Este era um estudo preliminar promissor, mas as limitações incluíram a natureza não controlada da investigação, limitando o seguimento, e a falta de medidas objetivas do resultado do tratamento.

O programa com terapia cognitivo-comportamental enfoca as cognições disfuncionais (padrões de pensamento) ou comportamentos (ações) que causam danos à pele ou ao cabelo, identificando assim comportamentos disfuncionais e substituindo-os por comportamento assertivo ou enfraquecendo padrões de pensamento negativo ao oferecer uma nova perspectiva de enfrentamento. Em um estudo não controlado conduzido, 12 entre 14 pacientes que completaram o protocolo para a TCC junto a TTM melhoraram, com uma redução de 67% no grau de severidade da TTM imediatamente ao fim do tratamento.

Em estudo randomizado, foi elaborado um programa utilizando a terapia comportamental que consistia em seis sessões individuais de 45 minutos com base em manual que era seguido a cada duas semanas. Os elementos principais eram controle de estímulo (organizando o ambiente), intervenções de estímulo-resposta (interrompendo a cadeia de resposta com outras atividades compatíveis) e conseqüências de respostas (auto-recompensa). O papel do terapeuta consistia em analisar o comportamento, ao mesmo tempo dando conselho técnico e motivando o paciente.

A evolução dos quadros de TTM ainda é pouco conhecida, embora a maior parte das populações clínicas acompanhadas apresente curso crônico sem remissão completa. Aparentemente, um melhor ou pior prognóstico depende da idade de início do quadro e da co-morbidade associada.

A literatura existente em TTM é relativamente limitada, mas crescente. O aumento das pesquisas em TTM resulta, em parte, da maior consciência de que os sintomas são mais comuns do que se acreditava. Embora no Brasil não tenha estudos de prevalência na população geral, pesquisas internacionais estimam taxas entre dois e três por cento, revelando assim um crescente número de pacientes com TTM, já que na década passada era de um por cento.

Edson Luiz Toledo – psicólogo coordenador do atendimento psicoterápico de pacientes com tricotilomania do Ambulatório Integrado dos Transtornos do Impulso - AMITI/IPq da FMUSP.


Dra. Bianca Bortolini

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